Gn 9,1-17 – rodapé da Bíblia Ave Maria
Como no início da criação (1,1-2,4a ), aqui Deus abençoa a obra criada e, de um modo muito especial, todos os seres vivos ( 1-3 ), e confia a Noé e sua família – como ao primeiro casal – o cuidado e a administração do resto da criação. Mas existe uma ênfase especial na responsabilidade com o irmão. De uma vez por todas o Senhor estabelece a sua posição a respeito da violação do direito à vida de cada ser vivo, mas especialmente do irmão (v. 5s ). Os vv. 8-17 nos apresentam a aliança de Deus com Noé. apesar de esta narração aparecer, no texto, antes de Abraão e da aliança de Deus com ele e com sua descendência (Gn 15,1-21 ), e muito antes da aliança no Sinai (Ex 19-24 ), na realidade é uma narração de aliança muitíssimo mais recente que a de Abraão e a do Sinai. Trata-se da aliança “noélica”, cujo sinal distintivo é o arco-íris.

A escola sacerdotal (P), preocupada em resgatar a identidade de Israel e sua exclusividade no mundo não pode negar que a paternal preocupação de Deus se estende a toda humanidade. Existe uma explicação para a inclusão desse texto nesse lugar. Depois do exílio, já está praticamente consolidada em Israel a crença monoteísta (cf, Is 44,5-8) e a consequente paternidade universal de Deus (Is 56,3-8). Entretanto, a crença dos israelitas em ser o povo escolhido resiste a aceitar que todos os humanos, sem exceção, estejam no mesmo plano de igualdade. Ao abranger a humanidade inteira sob a aliança com Noé afirma-se a paternidade geral de Deus sobre todos os seres vivos. O sinal, também universal, é o arco-íris, mas Israel está muito mais próximo de Deus, ocupa um lugar significativo em sua relação com ele pela aliança estabelecida com Abraão, cujo sinal é muito mais íntimo, uma marca que se leva na carne: a circuncisão (Gn 17,10s). A diferença entre Israel e o resto da humanidade vai ser eliminada por Jesus. Com ele ficam abolidas todas as formas de divisão e separação entre povos e crentes. Daí para frente, a única atitude que estabelece diferenças entre os fiéis é o amor e a prática da justiça, a escuta e a prática da palavra de Deus (Lc 11,28). Isso fica perfeitamente ilustrado na passagem evangélica sobre a ruptura do véu no templo que Marcos e Mateus narram por ocasião da morte do Senhor (Mt 27,51; Mc 15-38). O mesmo Paulo anuncia com força o fim de toda divisão de distinção (cf. Rm 10,12; Gl 3,28; Cl 3,11).